quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Dar lume

Fumar sempre esteve associado a alguma sensualidade, mistério e rebeldia.
Sempre foi, e continua a ser, um óptimo pretexto para iniciar uma conversa com alguém que consideramos interessante.
"Tens lume?"
A expressão é usada vezes sem conta e o tempo do cigarro é tempo para a conversa circunstancial e conveniente.
O flirt do cigarro ocorre agora mais explicitamente que nunca. A proibição de fumar em locais fechados fez com que os não fumantes passassem a desejar fumar, apenas para conhecer aquela/e rapariga/rapaz que vai lá fora fumar um cigarro. Mais, alguns e algumas passaram mesmo a fumar. Condição essencial para todos/as é o isqueiro sempre à mão... para "dar lume".

O jogo de sedução inicia no momento do "Dás-me lume?" e continua durante o período em que o cigarro ainda arde. Fazer render o cigarro é fazer render o tempo de sedução. É aumentar esperanças a quem está connosco. O contrário, acelerar o fim do cigarro, é como dizer que a pessoa não nos interessa. Que já chega, que a conversa não agradou.

Deixo-vos com Jorge Palma, grande poeta...

Jorge Palma,"Dá-me Lume"

"Dá-me lume, dá-me lume
Deixa o teu fogo envolver-me
Até a música acabar
Dá-me lume, não deixes o frio entrar
Faz os teus braços fechar-me as asas
Há tanto tempo a acenar."




(Foi o melhor vídeo que encontrei)

3 comentários:

catizzz disse...

Se é verdade a relação entre cigarros, lume e engate, também é verdade que muito se pode observar sobre um povo pela forma como estas situações são geridas. Em Portugal, por exemplo, há uns anos atrás as pessoas tinham algum pudor em pedir lume ou um cigarro a desconhecidos. Sobretudo cigarros. Já em Espanha era normalissimo sermos abordados por desconhecidos na rua a pedir lume ou cigarros. Na Holanda a mesma coisa. Aliás, tenho um amigo holandês que costuma dizer "pão e tabaco não se recusa a ninguém". Até nestes pequenos pormenores Portugal transborda em traumas. Cravar um cigarro a alguém que não conhecemos deixa-nos imediatamente numa posição de fragilidade. Até porque o que temos de mais certo é ouvir um redondo " não tenho!", normalmente seguido por um: "vai mas é trabalhar!" ou qualquer coisa do género. A coisa ameniza-se quando o cravado é um homem. Apesar de lhe custar horrores, até dá um cigarrinho à menina. "Será uma pelintra com certeza, mas normalmente essas tipas acreditam no amor livre e assim... pode ser que tenha sorte!".
Pronto, sei que a ideia era falar da sedução ligada ao fumo mas saiu-me isto! Ando muito atenta a estas questões de género... não faço ideia porquê! ;)
PS - adoro esta canção do Palma. Há-de aparecer na juke... carrega muita história para mim!

La Payita disse...

Andava na Faculdade. Almoçava muitas vezes no refeitório da reitoria. Tantas que acabei por conhecer as outras pessoas, como se fossem da família e aqueles fossem almoços do aniversário de alguém. Sem nunca ter falado com ninguém, que não fosse do meu grupo.

Naquele universo, os Cromos estavam catalogados. Havia um, alto, cabelos aos caracóis, desgrenhados, um ar tresloucado. Do curso de Desporto. Sempre sozinho.

Ia pôr o tabuleiro nos carrinhos altos de alumínio. Ao passar por ele, canta-me em plenos pulmões: "Dá-me luuuuuuuuuuume!!!".

Ainda hoje não sei como não me caíu o tabuleiro das mãos. Mudei de côr! E segui o meu caminho. Sem lhe dar lume...

Anónimo disse...

Pois eu, catz, estou plenamente de acordo com o teu amigo holandês! e olha que já fui desdenhada muitas vezes pelas pessoas que conheço por raramente dar esmolas e quase nunca me recusar a oferecer um dos meus cigarritos lights.

Já me ri bués com o cromo do desporto!

Grande música, Vasquito...